Foram 13 dias em La Habana, vividos entre o primeiro e o segundo turno das eleições brasileiras de 2010. Estar em Cuba foi a realização de um sonho e pretendo dividir minhas impressões neste blog!

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Balada num sábado habaneiro

Eu combinei com o Lemay de sairmos pra dançar: queria curtir uma salsa numa balada local, nada de shows pra turistas ou em hotéis. Eu tinha sido convidada por um garçon do Sotano, em Habana Vieja mesmo, que me abordou na rua, muito simpático. Lemay verificou suas fontes e concluiu que o lugar não tinha boa fama então fomos sem rumo pra Vedado. Chegamos cedo então sentamos num restaurante próximo pra comer algo. Eu pedi um prato com camarão, delicioso. Na hora de pagar a conta, foi engraçado, pois os refrigerantes eram em CUC e a comida em peso cubano! Isso realmente me soa como anomalia, mas é a realidade...
Na porta do Club bebemos duas cervejas nacionais antes de entrar: como fomos os primeiros a chegar, tivemos preferência e cortamos a fila que se formava. Lá dentro, clima de boite: luzes, strubo, um telão na parede do fundo e muita gente que se aglomerava. Sentamos. Depois dos primeiros 10 minutos os casais se arriscavam dançar a música latina e romântica que tocava. E o ritmo está mesmo no sangue daquelas pessoas! Todos aos meus olhos pareciam dançarinos profissionais e confesso que me acanhei. De repente um animador saca o microfone e incita as pessoas (já um tanto quanto alteradas pelo álcool) a cantarem. O homem de meia idade tinha voz de radialista de estação AM, negro e forte, usava um terno branco e anéis enormes, parecendo um malandro carioca (os esteriótipos, sempre eles..hehe..). A sessão de karaokê foi divertida e pela observação das letras, comentei com Lemay, que me explicou: músicos de Porto Rico são sucesso em Cuba e o tom romântico é mesmo o principal apelo das músicas. Afinal, existe coisa mais pop do que cantar o amor? Tinha um grupo que comemorava o aniversário de uma amiga, então em determinado momento o animador puxou uma cantada de feliz "cumpleaños" pra ela. Depois de mais algumas cervejas, dancei com Lemay. Saimos de lá e a volta foi uma epopéia. De Vedado até Habana Vieja é longe, então fomos até o ponto de ônibus. Na caminhada eu vi uma dupla de emos e me empolguei com meu companheiro de balada: "Existe emo em Cuba!" Era mais de 2 da manhã e havia muita gente na rua: grupos de jovens com violão, meninas lindas de salto alto e maquiagem, roqueiros tatuados e vestindo preto. Adoro gente na rua de madrugada. Em Berlin, no verão, há erventos noturnos, como a noitada em que os museus ficam abertos. Em Maringá pouca gente sai à pé, mas eu tenho feito isso com o Mário e tem sido bem legal. Bem, voltando à Habana, esperamos muito no ponto de ônibus. Lemay tentava chamar um taxi coletivo, mas eles já estavam cheios. Por fim, o ônibus passou e a diversão continuou: fomos correndo até o ponto, que ficava na rua transversal. Para minha surpresa, a noitada continuou no ônibus, pois tinha música no veículo e tudo era motivo de animação...

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Refletindo sobre o consumo

Toda vez que visito a casa de um amigo, fico incomodada com os móveis, brinquedos de criança e tralhas afins depositadas no fundo da casa. Quando as pessoas me perguntam como foi minha viagem à Habana, eu não consigo encontrar uma resposta imediata ou minha percepção numa frase só. Eu digo que ainda estou "digerindo" essa experiência  Então, é no meu dia a dia que acabo refletindo a respeito. Da mesma forma que essa reflexão ultrapassa a temática cubana, quando perceber o Brasil, as coisas que tenho vivido na minha cidade natal, Maringá, vira um exercício inevitável. Eu li que o Brasil é um dos países que mais desperdiça no mundo. De fato, administrar geladeira não é tarefa fácil para quem não aceita jogar alimento fora, como eu. Sempre tive esse cuidado e mesmo assim, de vez em quando vacilo. Então, depois de perceber a pouca variedade alimentícia dos cubanos, de perceber a carestia enfrentada por eles, quando me deparo com bens de consumo duráveis jogados nos cantos, abandonados, desperdiçados, eu me incomodo. Como tem sido ao visitar meu amigo no Jardim Tabaetê. Cadeiras, material de desenho, uma fruteira, estantes, enfim, objetos que não cumprem sua função de destino, mas que viraram entulho e apodrecem nos cantos. Notei que isso me perturba infinitamente e mesmo estimulando o dono da casa, meu lamento é vão. Nesse ponto tenho idéia bastante singular. Infleizmente o consumo é a alma do mercado e sem ele o sistema não funciona. Porém, estou convencida de que o sistema cria uma idéia de consumo exagerada, equivocada e maléfica. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra, como dizia meu pai. Nada disso é novo, mas eu vejo a aplicação dessa lógica de forma explícita depois da minha passagem por Cuba. Esse vídeo é bastante claro. É possível viver com pouco e geralmente muitos que estão submersos no nosso sistema percebem isso depois de fazer o caminho de Compostela ou de conhecer centros de meditação como o  Brahma Cumaris.
Falta de excesso, não é pobreza. 
Lembro agora da minha felicidade ao conhecer o Mauer Park em Berlin, onde pessoas comuns juntam objetos pessoais inutilizados e vendem: um super programa de domingo. A variedade de objetos é incrível e o passeio acaba sendo divertimento. Segunda mão é minha palavra de ordem. Sempre gostei de brechós, de ganhar roupas e sapatos usados das amigas e de ser presenteada com objetos "second hand". A feira de sábado da Benedito Calixto em São Paulo também é um super programa pra mim.
Enfim, reflito mais ainda sobre isso depois de ter estado em Cuba, onde há carência desse exercício exacerbado de consumo. Enquanto isso no Brasil, o mês de novembro teve recorde de inadinplência. E o motivo? Consumismo desenfreado...

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Sobre controle e violência

Apesar de receber constantemente o aviso de que eu deveria tomar cuidado com a bolsa quando saísse na rua, não tive sequer uma situação constrangedora ou de perigo. Em Cuba não há assalto à mão armada, sequestro ou situações de extrema violência. Entretando, o policiamento é constante e efetivo, inclusive de madrugada. Homens e mulheres uniformizados e desarmados fazem o papel similar à guarda civil no Brasil. Eu vi duas situações que me chamaram a atenção. Na primeira, duas jovens mulheres foram paradas por uma mulher policial que solicitou seus documentos, educadamente. Seus dados foram transmitidos através de um rádio e então elas foram liberadas. Enquanto tudo acontecia, as moças conversavam normalmente e pareciam muito calmas diante da "batida policial". Numa outra cena, vi que um casal, ela loira e nitidamente turista, e ele cubano, foram abordados pelos guardas. Depois de verificados os documentos do homem, o casal foi liberado cordialmente.
Eu andava e conversava com um cubano, quando do nada ele me disse preocupado, que se um guarda me questionasse, eu deveria dizer que estávamos apenas conversando, o que era um fato. Eu tinha ouvido no Brasil de que era proibido aos cubanos conversarem com turistas. Na verdade não é bem assim. Penso que a aproximação com os turistas pode ser uma forma de encontrar algum benefício. Explico: logo na segunda vez que fui ao restaurante de preço razoável, quando fui pagar a conta, a garçonete se aproximou e quase sussurrando perguntou se eu não tinha algum 'regalito', como uma roupa ou 'caramelo'. Eu achei estranha a abordagem e como levei duas caixas de chocolate na mala, eu andava sempre com alguns na bolsa. Eu lhe presenteei com dois chocolates. Certamente muitos cubanos se aproximam dos turistas com más intenções. Eu já disse aqui no blog que a grande arma dos cubanos gineteiros é o gogó, a lábia.
Numa ocasião fui jantar com dois rapazes e um deles era natural de outra província, Oriente. Por viver em Habana ele era obrigado a portar dois documentos: uma identidade que além dos dados gerais, como local e data de nascimento, nomes dos pais e foto, ainda tinha informações como altura, cor da pele, do cabelo e dos olhos. Porém, para viver em Habana, ele era obrigado a levar consigo uma autorização de permanência fora da sua provínvia, Oriente. E ainda, esse documento tinha data de validade, e caso ele decida continuar morando em Habana após a expiração do prazo, ele deverá apresentar-se aos órgãos competentes e tirar outra autorizacão. Caso contrário, se um guarda civil solicitar seus documentos e esses não estiverem em ordem, ele será levado para explicar sua situação irregular.
Essas são cenas comuns em Habana. Se não há violência, por outro lado há controle e verificação constante da conduta dos seus cidadãos. Então eu me questiono: tem como ser diferente? São formas de controle que refletem diretamente no índice de violência da república cubana, mas também de qualquer lugar do mundo...  

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A moda na Ilha de Cuba

Depois que vi o filme Buena Vista Social Club há alguns anos atrás, criei um certo preconceito ou esteriótipo sobre a vestimenta cubana: tendência estacionada nos anos 1960. Porém, durante os 13 dias na Ilha, percebi o quanto eu estava equivocada. Entre os jovens principalmente, ostenta-se camisetas estampadas com marcas famosas, como Douce & Gabana, Lacoste, Nice, Puma, Playboy, além do uso de piercings e tatuagens. Os cubanos são saudáveis, coloridos e vaidosos. Conheci rapazes que cantavam rap que tiravam sombracelhas e um deles tinha placas de ouro nos 6 dentes da frente; ele me disse que era moda. Outros usavam correntes douradas e cintos com a fivela em forma de um cifrão enorme, cravejado de strass: nada mais capitalista. Vi garotas com unhas enormes, pintadas e decoradas, como as que vi na Alemanha. 
Depois de um passeio pela cidade, quando eu voltava pra pensão, passei numa rua de onde se ouvia uma música alta. Parei, olhei pra cima e avistei um grupo de moços sentados na laje. Quando um deles olhou pra baixo, na minha direção, eu sorri e gesticulei, como quem desejava subir ali. Um deles, Frank, apontou a escadaria me convidando. Eu passei pelo interior de uma casa, depois de subir dois lances de escadas. Era um ensaio de rapers, numa mistura de tambores e música eletrônica. Uma das garotas usava um microshorts e rebolava como funkeira carioca. Foi lá que conheci o rapaz com os dentes dourados. Uma menina de seus 3 aninhos, usava uma jardineira com a estampa da Minie, a ratinha da Disney! A mãe incentivava a garotinha a dançar. Eu observava tudo sorrindo e procurava acompanhar os passos de um rap salsado ou seria de uma salsa raper? 
Nas ruas, observei a diversidade e a quantidade de uniformes do funcionalismo, considerando que mais de 90% dos empregos são públicos. Numa tarde botei na cabeça que tiraria fotos dos uniformizados que eu encontrasse nas ruas. E foram muitos. Muitas mulheres reponsáveis pela segurança de museus e galerias, usavam meia calça rastão, o que parece ser moda entre as cubanas. Flores de plástico coloridas no cabelo é coisa comum. No caminho de volta da praia do leste, impressionei-me com o motorista do ônibus cubano: rapaz sarado, vestindo camisa branca bem justa, tinha o cabelo curtinho arrepiado com gel e pequenas mechas descoloridas. Ele portava um óculos de sol com armação branca D&G e tinha as unhas do dedo mindinho compridas. E dirigia estiloso, lindo...
Em mais de uma ocasião, passei por uma espécie de centro cultural onde meninas de 12 ou 13 anos desfilavam roupas artesanais. Aliás, vi banquinhas de roupas de crochê nas calçadas, vendidas por jovens senhoras que crochetavam ali mesmo, sentadas.
De fato, eu me surpreendi com a inserção dos cubanos ao universo fashion, já que tinha criado uma ideia prévia: de que eles eram demodês... Mas quem disse que no socialismo não há vaidade e ostentação?
















quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Casa Blanca de Cuba

Da orla em Habana Vieja se vê o Cristo e a cúpula do centro de metereologia no alto da montanha, do outro lado do mar. Trata-se de Casa Blanca, outra municipalidade, próxima a entrada do porto de Habana, fica do outro lado da baía. A princípio eu não tinha intenção de visitar o lugar, mas Lemay foi muito solícito quando me convidou para um passeio até lá, irrecusável. Era sábado de manhã e o terminal de barcas ficava próximo do lugar onde eu estava hospedada. Fomos caminhando. Antes da chegada do barco, numa construção próxima dali, um grupo musical gravava um clip e a parafernália toda da produção chamava a atenção dos que aguardavam. Na entrada, alguns policiais verificavam as bolsas e mochilas das pessoas e também passavam um detector manual de metais. Uma policial, muito solícita e simpática me revistou; achei estranho, mas não questionei. Entramos no barco e a viagem durou menos de 10 minutos. As pessoas ficavam em pé, pois havia apenas 3 assentos. Alguns levavam bicicletas, outros malas. Lemay pagou minha passagem de 1 peso cubano. Já do outro lado da baía, cruzamos uma linha férrea e subimos Casa Blanca a pé: caminhada cansativa, mas a novidade da paisagem me animava. Vi uma banquinha de venda de frutas numa praça onde tinha uma árvore enorme, certamente centenária (foto). Fomos ao Cristo e de lá avistamos Habana Vieja, o Capitólio, o forte e parte do Malecón. Entramos no museu Casa de Che, onde estão os restos mortais do guerrilheiro mais famoso da Revolução Cubana. Há fotos e adereços pessoais dele. Como Ernesto era homem bonito e pra lá de charmoso! Vi fotos bastante sedutoras, mas isso eu não confidenciei à Lemay: pensei que seria afetado demais (suspirei às escondidas..hehe..). Estão lá as inseparáveis cuia e bomba de chimarrão, a mobília e a cama onde Che caiu enfermo logo depois da tomada de Habana. Uma foto enorme pendurada em cima da cabeceira da cama, mostra Fidel em visita ao amigo asmático. O passaporte falso feito quando seguiu para a Bolívia às vésperas da sua morte, mostra um homem sob disfarce perfeito. Há uma sala para conferências e pinturas feitas a partir da famosa foto de Alberto Korda, que tornou-se um ícone da cultura pop. Eu me lembro de ter visto camisetas com essa famosa imagem de Guevara à venda em quiosques de Veneza, Caracas e Barcelona!
Por fim passamos em frente ao centro metereológico, com a famosa frase de Fidel proferida em 1963, por conta do ciclone Flora: "Uma revolução é uma força mais poderosa que a natureza". O prédio faz parte do Estado Maior, super protegido e tem uma cúpula imensa que pode ser vista de longe (como mostra uma das fotos tiradas de Habana Vieja). A importância do centro é incontestável, já que a previsão no caso de ciclones requer alta teconologia e é responsabilidade do governo, que preza muito por isso.
Descemos passando pela igrejinha amarela que desejei conhecer desde a travessia, na ida: lindinha, clássica. Estava fechada, mas Lemay entrou pelos fundos e convenceu o sacristão a nos deixar entrar. Ele almoçava, comendo numa marmitex, não se constrangeu e nem fez sala, apenas nos deixou entrar. Antes de embarcar sentamos num restaurante, pedimos 2 pratos feitos com pescada e duas Maltas, espécie de refrigerante feito de cevada e malte. Lá eu descobri o quanto esses ingredientes me fazem mal... depois disso só bebia Tukola ou limonada. No pátio florido do restaurante havia um chafariz em homenagem à Iemanjá: tudo branco e azul claro, lindo. 
Antes de embarcarmos de volta, eu perguntei sobre o excesso de segurança na nossa ida. Lemay lembrou do causo de alguns anos atrás, quando cubanos desejosos em deixarem a Ilha sequestraram um daqueles barcos que iam a Casa Blanca, com o intuito de desembarcarem em Miami. Foram capturados, julgados e condenados à morte. Eu me lembro que esse episódio foi motivo da quebra do apoio de José Saramago ao regime cubano. Houve defesas e condenações na época. Do ponto de vista do regime, as pessoas inocentes que estavam dentro do barco, inclusive turistas, correram risco de vida, já que houve alguma violência. Com esse argumento, os desejosos dissidentes foram condenados à morte pela justiça cubana. Daí o controle rígido no nosso embarque. No que tange às leis de cada país, há pena de morte também em alguns estados norte-americanos...






terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Museu da Revolução

O prédio estava em reforma, mas o acervo do Museu da Revolução podia ser visitado normalmente, com poucos incovenientes. O museu foi instalado no antigo palácio presidencial, de arquitetura neo-clássica, foi construído na década de 1920. Depois da Revolução Cubana o lugar foi sede do governo até 1965: Fidel e seus ministros despachavam de lá, criando as principais leis de benefício popular. O acervo principal do museu trás dados da ilha de Cuba antes e depois da Revolução, como os índices de analfabetismo, por exemplo. De fato, para se entender a revolução cubana, é preciso conhecer o país antes de 1959. Cuba era o quintal dos americanos, que iam à ilha para se divertirem, jogando, bailando, contratando prostitutas e curtindo as praias paradisíacas. E para isso, era preciso manter o povo na plena ignorância e financiar governos autoritários. Eu conheci duas mulheres acima dos 60 anos que eram analfabetas aos 11, quando estourou o movimento. E no quesito educação, penso que a palavra revolução é perfeitamente adequada. São principalmente essas pessoas as grandes defensoras do sistema. Quanto aos jovens, a coisa muda de figura e merece um outro post...
Os instrumentos usados durante a guerrilha, como armas, uniformes, botas e utensílios cotidianos da guerrilha estão expostos no museu. Estavam lá os rádios transmissores usados na Sierra Maestra, tão importantes no processo de adesão das massas às ideias revolucionárias; a sala com as mesmas cadeiras e mesa onde sentara a equipe do governo revolucionário. O acervo do museu está disposto de um jeito bem tradicional. No último andar tem uma exposição de arte contemporânea e muita coisa em defesa dos 5 cubanos presos há mais de 10 anos nos EUA, acusados de terrorismo. Aliás, a cidade é cheia de cartazes e outdoors do governo em defesa dos 5, e também cartazes caseiros, escritos pelos cidadãos, exigindo a liberdade dos cubanos. Entre os objetos estão as roupas que Che Guevara usava quando foi assassinado pela CIA na Bolívia e os sapatos de Fidel, além de espadas e armas do período da guerra da Independência, acervo que fica no segundo andar. A parte mais interessante está anexa ao museu, do lado externo, onde estão expostos barcos, aviões, tanques e material bélico pesado. Lá está o barco que levou Fidel e os revolucionários do México para Cuba, assim como os aviões usados no emblemático conflito na baía dos porcos em 1962. Como todo museu em Habana, paga-se para entrar: 6 CUC ou 8 CUC, no caso de se desejar tirar fotos. Deixo algumas aqui:







domingo, 5 de dezembro de 2010

Um amigo diretor

Era meta: conhecer uma escola primária em Habana. Na primeira que encontrei fui entrando sem lançar olhares às pessoas. Aliás, a escrivaninha na porta estava vazia. Encantei-me com o jardim da escola, florido e verdejante. Passei ao largo de uma sala de aula e a própria professora veio atrás de mim para dizer que eu não poderia estar ali. Envergonhada, desculpei-me e segui meu rumo por Habana Vieja, incerto, certamente. Acho que era meu terceiro dia na cidade. Eu já tinha observado estudantes nas ruas, passeando com adultos, vestidos com um uniforme parecido com os da minha infância: jardineiras cor de vinho, mas os estudantes usavam lencinhos amarrados no pescoço: um charme.
No dia seguinte fui em outra escola bem próxima da pensão do Nelson. Me apresentei como professora de História, do Brasil. A atendente negra, sentada na escrivaninha próxima da entrada, disse-me que o diretor estava em reunião e que eu voltasse no dia seguinte. Assim eu fiz e conheci Lemay, de apenas 27 anos de idade, licenciado em Informática e diretor há menos de um ano. Fui com ele até sua sala, no térreo. Passamos pelo "jardin martiano", onde um busto do cubano mais ilustre do século XIX era rodeado de plantas. O primeiro diálogo foi suficiente para causar simpatia mútua. Sua integridade me comoveu; sua fala pausada em respeito as minhas dificuldades com a língua incentivou mais diálogos. Logo notei que eu havia encontrado um amigo. Nas paredes da sala, imagens de Che Guevara e uma pintura em retrado de Jose Marti. Entramos numa sala de aula no térreo e quando os alunos me viram, levantaram-se e declamaram seu lema, uma frase de Jose Marti. Todas as turmas decoram seu lema no início do ano letivo e quando recebem visitas, devem se levantar e declamar. Eles chegam na escola ás 7:30 e até às 8:20 ficam livres para falarem de si, de casa, da família, para os coleguinhas e aos professores. Há um intervalo pro lanche da manhã e o almoço é depois do meio dia. O dia letivo acaba às 17:30. Há muitas escolas em Habana Vieja, instaladas em prédios bem pouco conservados. Lemay estava preocupado com uma escada de madeira no fundo do prédio, que estava deteriorada e até perigosa. Os banheiros eram precários, mas não insalubres. Os alunos recebem gratuitamente o material escolar e duas mudas do uniforme são dados à cada 2 anos. Entre o primeiro e o segundo ciclos do ensino fundamental, a cor do lencinho no pescoço é mudada numa cerimônia: do azul para o vermelho (ou seria o contrário?)
Naquele dia eu não pude visitar outras salas de aula, pois havia uma espécie de inspeção na escola. Certamente eu voltaria no dia seguinte, afinal, entrei sozinha na escola primária Fabricio Ojeda, mas saí com um amigo...
Seguem as fotos: do jardim à José Marti, Lemay em sua sala e os primeiros estudantes que vi, na rua.


sábado, 4 de dezembro de 2010

O Canhonaço das 9

Era noite de 12 de outubro de 2010, um marco na minha viagem. O evento acontece todos os dias no forte de Habana. Apesar de ser uma atração turística, os cubanos também frequentam e sentem bastante orgulho do Canhonaço. Não raro quando conhecia alguém, logo se perguntava se eu já havia visto o Canhonaço. O complexo é bem grande, com um museu arqueológico, das armas e a sala de comandância, onde Che Guevara despachou logo que os revolucionários chegaram em Habana. Sem contar que o forte em si já é uma atração. Desde o café da manhã eu havia combinado com os dois colegas dinamarqueses da pensão de irmos juntos pra lá, de táxi. Pouco depois das 8 da noite, nos encontramos na  sala e seguimos juntos. No caminho, a avenida foi rebaixada e um longo trecho é subterrâneo, passando por baixo do mar. Já do outro lado chegamos no enorme forte, típico da colonização ibérica: suntuoso cumpridor dos seus deveres de proteção. Conhecemos as atrações anexas e 20 minutos antes das 21 hrs deu início a atração. Cerca de 50 jovens vestidos como soldados do século XIX desfilam com armas e ao som das típicas batidas militares, com tambores e trompetes. Trata-se de uma encenação diária que rememora a guerra da Independência, declarada em 10 de outubro de 1898. Como o espaço é grande, o público se locomove e caminha entre os soldadinhos e como bons turistas que são, tiram fotos e fazem filmes alucinadamente. Eu cheguei a me perder de Johan e Jens durante a encenação. Os soldados sobem numa parte mais elevada do terreno e encenam a explosão de um canhão. O barulho assusta, crianças choram...  seguem as palmas do público. A marcha militar retorna pelo mesmo caminho e a atração se finda. O evento é repetido diariamente, rememorando a história da independência cubana. Em Roma, cotidianamente também, mas ao meio dia, um canhonaço acontece na praça Garibaldi, um modo de rememorar a luta pela unificação italiana. São rituais cívicos, datas comemorativas que incentivam a minha reflexão. Quando eu planejava minha viagem à Cuba, estabeleci que passaria o 12 de outubro por lá, data em que Colombo desembarcou na América. Eu não sei desde quando essa data brasileira tornou-se feriado católico em prol de uma santa, ou melhor, de uma imagem de pau encontrada num rio paulista em 1710 (?); nem de quando foi estabelecida a data comercial de "Dia das crianças", mas tenho cá pra mim que isso não foi à toa. A distância existente entre o Brasil e os países latino-americanos é larga e evidente. Então penso que os significados do 12 de outubro em datas tão disparatadas tenha funcionado como ponto de dispersão para identidades similares. Na verdade eu nunca engoli esse disparate. No Brasil a data serve para rezar e comprar.
Nessa música do Orishas, há referência ao evento: http://www.youtube.com/watch?v=L2eV20UhkQk
Seguem algumas fotos da parada militar diária de Habana:



quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Novela brasileira e autênticas boas vindas

Depois de me acomodar na pensão, decidi dar uma volta pelas redondezas. A noite caia. Sem mapa e apenas com o meu sentido de orientação, passei pela igrejinha linda de pedra do século XVI e continuei caminhando a procura de um restaurante. Pedi informação para alguns policiais, que me indicaram uma rua próxima com diversas opções. Eu entrei num restaurante típico catalão e era intevalo da banda de salsa. Pedi uma cervja nacional e um prato com camarões. Atrás do balcão, suspenso, um aparelho de TV ligado. Havia apenas outra mesa ocupada, com turistas norte-americanos, o que presumi pelo sotaque. Duas mulheres que trabalhavam ali saíram afoitas da cozinha mirando a televisão. E para minha surpresa, a novela exibida era "A favorita", da rede Globo. Achei graça na dublagem em espanhol e então aquela primeira noite me foi familiar. Os cubanos tem novelas próprias, mas são apaixonados pelas nossas. Não foi apenas uma vez que ao me identificar como brasileira, a pessoa comentava seu gosto por nossas novelas. E o diálogo sempre seguia com minhas críticas, claro. Diferente do Brasil, onde tem-se diariamente 5 novelas num único canal, as novelas globais em Cuba passam dia sim dia não, alternadas com as mexicanas e cubanas. Meus interlocutores me ouviam com atenção e quase sempre achavam um exageiro mesmo. De fato a grade de programação da tv brasileira é um lixo e ao meu ver funciona como potente ferramenta ideológica. Sem exageiros, basta refletir um pouco...
Enfim, a TV cubana oferece aulas de línguas: pode-se aprender inglês, italiano, espanhol e até português através de cursos de bom nível. No dia 10 de outubro, quando se comemora a independência, assisti pela manhã um desenho animado educativo e também de algum modo propagandístico, sobre a guerra da Independência, com personagens típicos e certo grau de romance entre o menino crioullo e a mocinha.
Infelizmente na pensão do Nelson só pegava um canal e ainda assim muito mal, o Cuba Vision. Mas notei durante uma saída, quando se exibia a novela brasileira, que as pessoas ficam em suas casas, nas cadeiras de balanço (vi muitas) vidradas na telinha.
No jantar da minha primeira noite, a banda recomeçou o show e o volume da televisão foi baixado. Como eu já havia papeado com um dos integrantes, eles recomeçaram tocando uma versão cubana de garota de Ipanema, lançando sorrisos e entusiasmo. Não poderia haver boas vindas mais agradáveis.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Um ciclone de passagem pela Ilha

O guia caseiro de Maria avisava que entre julho e novembro viajar pra Cuba era um risco, pois esses são meses de furacões. Como meu passaporte vence em dezembro, nem cogitei mudar meus planos de viagem. A tarde estava nublada e depois de uma longa caminhada pela cidade, voltei à pensão. O rádio noticiava a passagem de um ciclone por Santa Clara, que seguia em direção à Habana. Era fim de tarde e adormeci lendo no quarto. Quando levantei, com um pouco de fome, já não tinha luz na casa. Como meu rádio era de pilhas, sequer percebi. Fui ler na sala. Chovia muito lá fora e o vento arrastava objetos que batiam nas paredes, provocando barulhos aleatórios. As janelas foram fechadas e quando já não havia luz natural para ler, o jeito foi dormir mais um pouco. Acordei por volta das 21 horas, ainda sem energia elétrica nas redondezas. Nessa parte de Habana os fios elétricos ainda são externos e a falta de luz é normal quando chove. Em outros lugares o sistema é subterrâneo e não há mais esse tipo de problema. Mas naquela hora não chovia mais, então decidi sair para comer e vasculhar Habana Vieja depois do temporal. Na verdade o ciclone em si não passou pela cidade e sim pelo mar próximo. Meus parâmetros de comparação era Niterói depois da tempestade. Me lembro de uma noite escabrosa em que voltei de bicicleta pra casa: a cidade estava alagada e uma multidão de ratazanas enormes se posicionavam em cima dos sacos de lixo e as baratas saiam dos esgotos feito água. Então eu me perguntava como estaria Habana depois daquele temporal. Protegida com uma capa de chuva, segui meu caminho ansiosa. Andei pro cerca de 5 quadras na escuridão. Algumas pessoas estavam nas calçadas e outras tantas dentro de casa conversando à luz de velas. O restaurante onde eu comia com frequência estava sendo fechado e diante da minha indignação, o ciclone levou a culpa. Logo em frente havia uma portinha que vendia pizza barata: 10 pesos cubanos ou 1 CUC, preço ótimo. Comi no balcão papeando com a funcionária, que já ia fechar o estabelecimento.
Devo dizer que não vi um rato, uma barata no meu caminho. Havia poças d´água, inevitáveis, mas alagamento nenhum. A saúde pública em Cuba é famosa mundo afora. Eu observei mais de uma vez homens entrando nas casas com uma espécie de aspirador de pó grandão e barulhento, espelindo fumaça pra dentro das casas. É o "fumacé" da dengue, diferente do Brasil, onde um caminhão passa pelas ruas. Em Cuba a proteção entra nas residências.
Voltei pra casa cantarolando uma salsa que eu tinha ouvido no caminho, pulando as poças e sentindo um alívio imenso ao pensar no caos causado pela chuva ríspida de quando vivia em Niterói....